Catálogo De Produtos da Duimp - Inserção De Dados Sensíveis e Segredo Industrial
Resumo
O presente artigo analisa a obrigatoriedade de inserção de dados sensíveis e informações protegidas por segredo industrial no Catálogo de Produtos da Declaração Única de Importação (DUIMP), instituído pelo Portal Único de Comércio Exterior no Brasil. Discutem-se os limites legais e constitucionais dessa exigência, bem como os potenciais riscos de vazamento e uso inadequado dessas informações.
Sustenta-se que a obrigatoriedade, nos moldes atuais, viola princípios constitucionais, a Lei de Propriedade Industrial e a Lei Geral de Proteção de Dados, configurando uma exigência desproporcional e ilegal.
1. Introdução
O Catálogo de Produtos, criado no contexto do Portal Único Siscomex, objetiva padronizar e detalhar informações sobre mercadorias importadas, facilitando o controle aduaneiro e a análise de risco. Todavia, a obrigatoriedade de inclusão de atributos técnicos e detalhados, especialmente para produtos químicos e tecnológicos, levanta preocupações relacionadas à violação de direitos empresariais, ao risco de vazamento de informações sensíveis e à exposição de segredos industriais.
Este artigo examinará a legalidade dessa exigência, considerando as garantias constitucionais, a proteção à propriedade industrial e os limites impostos pela legislação brasileira de proteção de dados.
2. A Exigência de Informações no Catálogo de Produtos
O Catálogo de Produtos da DUIMP é uma ferramenta desenvolvida para centralizar informações sobre produtos importados, permitindo que atributos técnicos, como composição, dimensões e finalidades de uso, sejam registrados e reutilizados em declarações subsequentes. Essa iniciativa visa otimizar os processos de fiscalização e controle.
No entanto, a obrigatoriedade de inclusão de detalhes sobre composição química, tecnologias empregadas e proporções de componentes coloca os importadores e fabricantes em uma situação delicada, pois tais informações muitas vezes constituem segredo industrial, elemento essencial para a competitividade empresarial.
3. O Segredo Industrial e sua Proteção JurídicaA proteção ao segredo industrial é garantida por um arcabouço jurídico robusto:
3.1 Constituição Federal
O Art. 5º, X, assegura o direito à intimidade e à vida privada, extensível à confidencialidade empresarial.
O Art. 5º, XXIX, incentiva a proteção da propriedade industrial, visando o desenvolvimento tecnológico e econômico.
3.2 Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/1996)
O Art. 195 protege segredos industriais contra uso ou divulgação indevida, dentro do rol de crimes de concorência desleal.
A obrigatoriedade de fornecer informações estratégicas sem garantias adequadas de sigilo ou necessidade clara pode ser interpretada como uma violação da Lei.
3.3 Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD, Lei nº 13.709/2018)
A LGPD impõe princípios como a minimização de dados (Art. 6º, III), que exige que apenas as informações estritamente necessárias sejam coletadas e tratadas.
Informações comerciais sensíveis podem ser equiparadas a dados pessoais sensíveis, dada sua relevância para a sobrevivência empresarial.
4. A Ilegalidade da Exigência de Dados Sensíveis
A obrigatoriedade de inserir dados protegidos por segredo industrial no Catálogo de Produtos apresenta várias inconsistências legais:
4.1 Violação ao Princípio da Proporcionalidade
A exigência desproporcional de informações detalhadas, sem justificativa clara quanto à sua essencialidade para o controle aduaneiro, viola o princípio constitucional da proporcionalidade. O Estado deve equilibrar a necessidade de fiscalização com a proteção de direitos fundamentais das empresas.
4.2 Risco de Vazamento e Uso Indevido
O sistema do Portal Único Siscomex, apesar de moderno, não oferece garantias absolutas de segurança. A integração com softwares de terceiros aumenta o risco de vazamento de dados sensíveis, expondo empresas à concorrência desleal e prejuízos financeiros.
4.3 Contrariedade à LGPD e à Lei de Propriedade Industrial
O tratamento inadequado de informações protegidas, sem garantias de confidencialidade ou consentimento explícito, contraria a LGPD. Além disso, a imposição de fornecer segredos industriais sem mecanismos claros de proteção contraria o Art. 195 da Lei de Propriedade Industrial.
5. Consequências Jurídicas e Econômicas
A exigência desmedida de informações sensíveis pode gerar graves consequências para as empresas, como:
Vazamentos de dados que alimentarão softwares privados;
Perda de competitividade devido ao vazamento de segredos industriais;
Aumento de litígios judiciais para proteção de direitos empresariais;
Desconfiança nas relações entre o setor privado e o poder público.
Além disso, a União pode ser responsabilizada por danos causados pelo vazamento ou uso inadequado das informações fornecidas.
6. Alternativas Viáveis e Propostas
Para harmonizar os interesses do Estado e das empresas, sugere-se:
Limitar as Exigências de Atributos: Restringir os dados obrigatórios a informações indispensáveis para a fiscalização.
Implementar Mecanismos de Sigilo: Garantir que dados sensíveis sejam acessíveis apenas por agentes autorizados, com registros de acesso e criptografia avançada.
Oferecer Alternativas às Empresas: Permitir que informações sensíveis sejam apresentadas apenas mediante exigência específica, preservando segredos industriais em operações regulares.
Acesso limitado: Dados deveriam ser inseridos e acessados exclusivamente pelo administrador da empresa importadora, identificado por seu CPF, sendo vedado, em qualquer circunstância, o acesso por terceiros, ainda que atuem como mandatários.
7. Conclusão
A obrigatoriedade de inserção de dados sensíveis e protegidos por segredo industrial no Catálogo de Produtos da DUIMP, nos moldes atuais, é desproporcional e ilegal. Essa prática compromete direitos constitucionais, viola a legislação de propriedade industrial e contraria os princípios da LGPD.
É imperativo que a Receita Federal reveja essas exigências, adotando medidas que equilibrem o controle aduaneiro com a proteção dos direitos empresariais. Além disso, ações judiciais e administrativas devem ser promovidas para garantir a proteção desses direitos, preservando a competitividade e a segurança das empresas no comércio exterior.
Rogerio Zarattini Chebabi
OAB/SP 175.402
Palavras-chave: Catálogo de Produtos, DUIMP, Segredo Industrial, LGPD, Propriedade Intelectual, Direito Aduaneiro, Comércio Exterior.
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